Síndrome dos Ovários Policísticos
- Rosiane Ferrão
- 4 de fev. de 2019
- 5 min de leitura

SOBRE A DOENÇA
Em 1935 Irving Freiler Stein e Michael Leventhal, publicaram um relatório intitulado "Amenorreia associada aos ovários policísticos". Eles foram os primeiros a fazerem a associação entre ovários policísticos e sinais como amenorreia, infertilidade, hirsutismo e obesidade. A síndrome descrita por eles levou seus nomes: Síndrome Stein-Leventhal. Atualmente é conhecida como Síndrome dos Ovários Policísticos (SOP).
SOP é uma doença endócrina bastante complexa, que acomete 5 a 10% das mulheres em idade fértil. Nem toda mulher que apresenta ovários policísticos desenvolve a síndrome.
A causa da SOP ainda não está bem esclarecida, parece ser uma doença poligênica, mas até o momento não foi determinado nenhum gene ou grupo de genes como responsável pela síndrome. Pelo fato da SOP ter estreita relação com os distúrbios do metabolismo de carboidratos e lípides, atualmente a doença é vista como uma doença metabólica, e o aparelho reprodutor deixou de ser o foco e o indivíduo passou a ser tratado como um todo.
A síndrome tem grande repercussão ao longo de toda a vida da mulher, levando à obesidade, infertilidade, resistência à insulina, dislipidemia, diabetes gestacional, diabetes tipo 2, aumento do risco de doença cardiovascular, depressão e diminuição da qualidade de vida.
FISIOPATOLOGIA

Na SOP ocorre uma hipersecreção de LH e diminuição da secreção de FSH. O LH em excesso estimula as células da teca a produzirem maior quantidade de andrógenos, principalmente a testosterona, não havendo a conversão da testosterona em estradiol, justamente pelo “descontrole” dos níveis de FSH e LH. Daí o hiperandrogenismo. Além disto, os baixos níveis de FSH circulantes levam a ciclos anovulatórios, com desenvolvimento de múltiplos folículos, mas que, no entanto, não têm o desenvolvimento normal e acabam estacionando em estágios intermediários. Daí os ovários policísticos. Esses ciclos anovulatórios levam à atrasos menstruais e ciclos longos, o que favorece a infertilidade.

Imagem de internet
Mulheres com SOP também apresentam maior resistência à insulina, com consequente aumento de seus níveis sanguíneos, e a insulina, além de estimular as células da teca a produzirem andrógenos elas estão envolvidas na diminuição da produção, pelo fígado, do SHBG -Steroid Hormone Binding Globulin, que é uma proteína transportadora dos hormônios sexuais. Sendo assim, há maior concentração de hormônios livres (testosterona livre), o que gera os sinais e sintomas clássicos do hiperandrogenismo, como hirsutismo, acne, pele oleosa, queda de cabelo.
Além dos mecanismos acima referidos, ocorre a dislipidemia associada a altos níveis de triglicérides e baixos níveis de colesterol-HDL. Isto ocorre porque a resistência à insulina leva à maior liberação de ácidos graxos livres pelos adipócitos, ao mesmo tempo em que o fígado determina menor supressão na síntese de VLDL. Isto resulta em liberação de grande quantidade de VLDL, que são partículas ricas em triglicérides e que geram uma cascata de acontecimentos que levam à redução das partículas de HDL.
Como dito, há fortes evidências da associação com fatores genéticos, oligo ou poligênicos
DIAGNÓSTICO
Alguns consensos foram elaborados para a definição da SOP. Apesar de a doença ter sido descoberta em 1935, somente em 1990 foi elaborado o primeiro consenso pelo National Institutes of Health (Consenso do NIH), depois em 2003 foi elaborado outro consenso pelo European Society of Human Reproduction and Embryology/American Society of Reproductive Medicine (Consenso de Rotterdam), que foi revisado em 2012 e em 2009 outro, elaborado pela The Androgen Excess and PCOS Society (AE-PCOS Society). Estes documentos têm leituras diferentes e complementares da síndrome. O consenso de Rotterdam é o mais utilizado e também o mais flexível, e devido a este fato é o que os outros consensos foram criados, com critérios mais rígidos, na tentativa de diminuir os diagnósticos onde nem todos os sinais clássicos estivessem presentes.
Critérios diagnósticos para a síndrome dos ovários policísticos segundo os Consensos do NIH, Rotterdam e AE-PCOS Society.

Existe um consenso comum, entretanto, de que o diagnóstico deve se dar na presença de pelo menos dois, dos três desses critérios: anovulação crônica, hiperandrogenismo (clínico ou biológico) e ovários policísticos.
O diagnóstico é normalmente clínico, já que a maioria das mulheres apresentam irregularidade menstrual e hiperandrogenismo clínico. Existem alguns critérios que os médicos utilizam para o diagnóstico do hiperandrogenismo, já que visualmente é um critério mais subjetivo. Um desses critérios é o Índice de Ferriman-Galleway, que se baseia na quantificação de pelos em áreas andrógenos-dependentes, como visto na figura abaixo:

Fonte: MedicinaNET – imagem de internet
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL AUXILIAR
Prolactina
Em 10% dos casos a prolactina encontra-se elevada.
FSH
Baixos ou próximos aos níveis inferiores.
LH
Menos de 50% das mulheres apresentam valores elevados de LH em uma única dosagem, o que torna a dosagem deste hormônio desnecessária.
TSH
14 A 20% das mulheres apresentam níveis elevados de TSH e este fato parece estar associado a um pior perfil metabólico dessas pacientes.
Deve-se, sempre, descartar outras causas de hiperandrogenismo como hiperprolactinemia, disfunções tireoidianas, tumor ovariano produtor de andrógenos, tumor adrenal e hiperplasia adrenal congênita.
A seguir são apresentados os exames para o diagnóstico diferencial:
Hiperprolactinemia:
Dosar prolactina. Se elevada repetir em nova amostra
Disfunções tireoidianas:
Dosagem de TSH. Se alterado repetir a dosagem em nova amostra, juntamente com T4 livre.
Tumor ovariano produtor de androgênio
Dosagem de testosterona total ou livre
Tumor adrenal
Dosagem de deidroepiandrosterona sulfatada (DHEA-S)
Hiperplasia adrenal congênita (HAC)
Dosagem de 17-alfa-hidroxiprogesterona (17OHP), dosado na fase folicular do ciclo. Em casos suspeitos confirma-se o diagnóstico através do teste da cortrosina.
MODIFICAÇÃO DO ESTILO DE VIDA
A perda de peso favorece o aumento das concentrações plasmáticas do SHBG, diminuição dos níveis sérios de insulina e dos andrógenos, sendo um grande aliado no tratamento da SOP. Por isso a mudança do estilo de vida, com dieta e exercícios físicos é primeira medida auxiliar a ser tomada.
Por Rosiane e Silva Menezes Ferrão
Farmacêutica-Bioquímica pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Especialista em Análises Clínicas pela Universidade São Francisco (USF)
Siglas
17OHP - 17 alfa-hidroxi progesterona
DHEA-Sulfato de dehidroepiandrosterona
FSH - Hormônio folículo estimulante
HAC - Hiperplasia adrenal congênita
HDL - High Density Lipoprotein - Lipoproteína de alta densidade
LDL - Low Density Lipoprotein, - Lipoproteína de baixa densidade
LH - Hormônio luteinizante
SHBG - Steroid Hormone Binding Globulin – Globulina ligadora dos hormônios sexuais
SOP - Síndrome dos ovários policísticos
T4 - Tiroxina
TSH - Thyroid-stimulating hormone - Hormônio tireoestimulante
VLDL - Very Low Density Lipoprotein) - Lipoproteína de muito baixa densidade
Bibliografia:
1 - Azziz R, Adashi EY. Stein and Leventhal: 80 years on. Am J Obstet Gynecol. 2016 Feb;214(2):247.e1-247.e11. doi: 10.1016/j.ajog.2015.12.013. Epub 2015 Dec 15. Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/26704896
.Acesso em 21/01/2019
2 - Baracat EC, Soares Junior JM. Ovários policísticos, resistência insulínica e Síndrome metabólica. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. vol.29 no.3 Rio de Janeiro Mar. 2007. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-72032007000300001. Acesso em 16/01/2019
3 –FEBRASGO: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Síndrome dos ovários policísticos (Série, Orientações e Recomendações FEBRASGO, no.4/Comissão Nacional Especializada em Ginecologia Endócrina). 103p. 2018. Disponível em https://www.febrasgo.org.br/media/k2/attachments/18Z-ZSndromeZdosZovriosZpolicsticos.pdf. Acesso em 16/01/2019
4 - FASSOLAS, Georges. Síndrome dos ovários policísticos. Medicinanet. Disponível em http://www.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/2873/sindrome_dos_ovarios_policisticos.htm. Acesso em 20/01/2019
5 - MARCONDES JAM , BARCELLOS CRG, ROCHA MP. Dificuldades e armadilhas no diagnóstico da Síndrome dos Ovários Policístsicos. Arq Bras Endocrinol Metab. 2011;55/1. Disponível http://www.scielo.br/pdf/abem/v55n1/02.pdf. Acesso em 15/01/2019
6 - PONTES Ana Glória. Síndrome dos Ovários Policísticos: diagnóstico, tratamento e repercussões ao longo da vida. Ana Glória Pontes. Benedito de Souza Almeida Filho – Botucatu: Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho. Faculdade de Medicina de Botucatu. 2016. Disponível em http://www.hcfmb.unesp.br/wp-content/uploads/2015/09/Ebook-SOP.pdf. Acesso em 20/01/2019
7 – Santana LF, Ferriani RA, Sá MFS, Reis RM. Tratamento da infertilidade em mulheres com síndrome dos ovários policísticos. Rev Bras Ginecol Obstet. 2008; 30(4):201-9. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-72032008000400008&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em 10/01/2019
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